Os Carotenoides e a Vitamina A - Cromatografia Líquida

Sidney Pacheco

A vitamina A é na verdade um grupo de substâncias, os retinóis. Estes são encontrados em tecidos animais e não estão presentes nos vegetais. No organismo humano a vitamina A está na forma de três substâncias, o retinol (estrutura ao lado), o ácido retinóico e o aldeído retinal.

Conversão de carotenoides em retinol
Molécula de Retinol

A vitamina A está associada a uma série de importantes processos biológicos no organismo, como na visão, no sistema imunológico, na reprodução e na manutenção da integridade da pele. A carência da vitamina A, ou hipovitaminose A, é a causa de uma série de doenças, dentre elas a xeroftalmia, também conhecida como olho seco ou cegueira noturna. A xeroftalmia inicia com o ressecamento e irritação dos olhos e com a dificuldade para enxergar sob pouca luz, podendo evoluir para lesões nos olhos, cegueira permanente e em casos graves até a morte, acometendo especialmente crianças. A hipovitaminose A ainda é considerada o principal problema nutricional de populações de baixa renda. Quando o consumo de alimentos de origem animal ricos em vitamina A é insuficiente, a sua principal fonte torna-se os alimentos de origem vegetal, no entanto, os vegetais fornecem-na na forma das provitaminas A, que são os carotenoides.

Os carotenoides podem ser divididos em dois grupos de acordo com sua atividade vitamínica; os precursores de vitamina A e os que não podem ser usados na síntese do retinol. Dentre os cerca de 600 carotenoides conhecidos, apenas aproximadamente 50 são carotenoides pró-vitamínicos A. As fontes de provitamina A mais abundantes nos vegetais são o beta-caroteno, o alfa-caroteno e a beta-criptoxantina.

O que determina a atividade vitamínica do carotenoide é a presença do anel beta-ionona na estrutura (Figura). O todo-trans-beta-caroteno apresenta duas dessas estruturas, enquanto todos os demais carotenoides pró-vitamínicos A apresentam apenas uma. Deste modo, o beta-caroteno é o metabólito vegetal mais importante como fonte de vitamina A, podendo ser convertido, através da clivagem enzimática, em duas moléculas de retinol.

A conversão de Carotenoides em Vitamina A
Para poder ser convertido em Vitamina A o carotenoide deve possuir
ao menos uma estrutura beta-ionona na molécula (representada na figura pelo retângulo).
O beta-caroteno é o único com duas dessas estruturas, desse modo pode ser 100% convertido em Retinol.


Os fatores de conversão de carotenoides em Retinol

A síntese da vitamina A se dá através da ação da enzima beta-caroteno-15,15´-dioxigenase, que em mamíferos tem sua máxima atividade na mucosa intestinal. Por ser esta enzima exclusiva de animais, o retinol não existe em tecidos vegetais, deste modo, é errada a afirmação de que vegetais são fonte de vitamina A. As frutas e verduras são excelentes fontes sim, mas de pró-vitamina A, que são os carotenoides.

O retinol formado pela ação da enzima sobre os carotenoides na parede do intestino é absorvido e se soma com o retinol pré-formado ingerido através do consumo de alimentos de origem animal, principalmente carnes, leite e derivados e ovos.

Devido à presença de dois anéis beta-ionona na molécula de beta-caroteno, este pode ser 100% convertido em retinol, ou seja, 1mg de beta-caroteno é capaz de produzir 1mg de Retinol. No entanto, nem todo o carotenoide ingerido é transformado em retinol em nosso organismo, a eficiência desta conversão depende de inúmeros fatores, como por exemplo, o tipo de alimento que está sendo ingerido, o estado nutricional do indivíduo e sabe-se ainda que a eficiência da conversão varia muito de indivíduo para indivíduo. Mesmo assim, foram estabelecidos fatores de conversão para calcular o teor de retinol equivalente dos alimentos (RE), tendo como base os teores de carotenoides e retinóis presentes no alimento. Em 1974, a Academia Nacional de Ciências e o Conselho Nacional de Pesquisa (NAS/NRC) propuseram os fatores de conversão, estes foram revisados e atualmente os valores mais utilizados são:

Fatores de conversão de Carotenóides em Vitamina A

Exemplo de cálculo de Retinol Equivalente de um alimento

Apesar de práticos, por permitirem a comparação direta dos teores de vitamina A em alimentos, os fatores de conversão dos carotenoides em retinol equivalente ainda são polêmicos. Existem muitas considerações a serem discutidas antes de utilizá-los indiscriminadamente. A principal consideração é que a simples presença de carotenoides em um alimento não é garantia de que estes carotenoides estarão disponíveis para absorção e conversão em retinol. Muitos estudos estão em andamento a fim de se estabelecer a biodisponibilidade dos carotenoides presentes nas matrizes alimentares. Além disto, por serem os carotenoides lipossolúveis, a presença de lipídios na dieta se faz fundamental para a sua absorção.

O tipo de matriz alimentar também influencia muito na absorção dos carotenoides. Nas folhas das plantas, por exemplo, os carotenoides estão presentes nas células dentro dos cloroplastos, desta maneira outro importante pré-requisito para a utilização satisfatória desses carotenoides é que a estrutura celulósica da parede celular seja rompida. Essa ruptura é obtida geralmente através da cocção e mastigação do alimento. No caso de frutas, a estrutura da parede celular é normalmente muito mais fraca que nas folhas. Além disso, os carotenoides são encontrados nas gotas de lipídios, quando presentes, e nos cromoplastos. De modo geral, os carotenoides de frutas são mais biodisponíveis que os carotenoides de folhas.

Para que os carotenoides estejam biodisponíveis ao organismo para a conversão na vitamina A, estes são distribuídos na fase lipídica durante a alimentação que, sob a ação de enzimas e ácidos digestivos, é convertida em micelas. Na fase aquosa as micelas são distribuídas na forma de uma suspensão estável. Transportados à mucosa intestinal, uma fração dos carotenoides sofre a ação da enzima responsável pela conversão em retinol que é então absorvido e transportado até o fígado onde é armazenado. Parte dos carotenoides ainda é absorvida sem modificações e circulam pelo organismo através do plasma.

A atividade enzimática ainda depende de outros fatores, evidências sugerem que ela é aumentada pela deficiência de vitamina A e reduzida pela deficiência de proteínas. As grandes variações de teores dos carotenoides em uma mesma matriz, as variações de capacidade de absorção dos carotenoides de cada indivíduo e a grande variação de biodisponibilidade das matrizes, demonstram que simples fatores de conversão são inapropriados. Desta maneira alguns autores sugerem que o uso de dados em equivalentes de retinol devam ser abandonados, e as tabelas de composição de alimentos devam reportar apenas os teores de retinol e os teores dos carotenoides individuais presentes no alimento. No entanto os fatores de conversão são largamente utilizados há muito tempo na área de saúde, e o seu simples abandono deixaria tais profissionais sem estas importantes referências.

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